quinta-feira, abril 07, 2011

O Sócrates, o FMI e os Alienados

"A notícia é falsa. Não passam de rumores sem fundamento." [1]
Reacção do gabinete do Primeiro-Ministro à notícia avançada ontem pelo britânico Financial Times sobre um eventual contacto entre Portugal e Bruxelas para se avançar com o pedido de ajuda externa.


E hoje temos...


Sócrates pede ajuda externa à Comissão Europeia [2]


- Mas isso não era mentira?!

Era, quer dizer, agora não é, ou seja...bem...avancemos...

"O Governo decidiu hoje mesmo dirigir à Comissão Europeia um pedido de assistência financeira por forma a garantir as condições de financiamento do nosso país, ao nosso sistema financeiro e à nossa economia. Fizemo-lo nos termos que têm em conta a situação política nacional e as limitações constitucionais do Governo, como Governo de gestão (...) o rating da república desceu, as taxas de juro dispararam, os bancos e as grandes empresas portuguesas viram o rating baixar desde então (...) Desde a rejeição do PEC acentuaram-se as dificuldades de financiamento da república e da economia portuguesa (...) as taxas de juro de hoje (...são um) sinal claro da crescente dificuldade do nosso país em se financiar (...) Lutei nestes últimos anos para que isto não acontecesse. Tínhamos uma solução e ela foi deitada fora (...) Sempre encarei um pedido de ajuda externa como um último recurso. Tudo tentei, mas em consciência julgo que chegámos ao momento em que não tomar essa decisão acarretaria riscos." - José Sócrates

Vamos analisar o discurso Socrático? Vamos, vamos?
- Vamos!

Ok, é dado adquirido: Portugal vai receber a 'ajuda' externa.

- Porque é que escreveste 'ajuda' e não 'ajuda'?

Manipulação da opinião pública, já ouviste falar?
É que este fantástico pacote de 'ajuda' não vem a custo zero. Traz maravilhosas contrapartidas, para ti, para mim, para todos! (Olha como eles são generosos.) Porque isto não é nada mais do que um empréstimo e as medidas de austeridade impostas por Bruxelas - podes chamar-lhes União Europeia, Banco Central Europeu, tanto faz...lá no fundo, vai dar ao mesmo. Pois Portugal já constatou o que a maravilhosa 'ajuda' fez nos restantes países que receberam a BBCE - Benção do BCE; Irlanda e Grécia continuam com as suas dificuldades, para além de terem dois recém-nascidos ao colo chamados Juros e Austeridade.

Sim, porque a 'ajuda' vem, mas tem de ser devolvida...mais tarde ou mais cedo...e com juros.

- Hum...entendo...afinal os nossos políticos falam tanto em ajuda, mas só estão a endividar mais o país, certo?

Certo.
E relativamente ao pacote de 'ajuda' que aí vem, alguns falam em 75 mil milhões de Euros [3], outros em 90 mil milhões [4], mas pegando no valor mais baixo, podemos fazer uma breve análise:

Em Portugal somo sensivelmente 12 milhões e se dividirmos os 75 mil milhões de Euros por cada português, temos 6,250.00€ por português. E isto tem de ser pago num determinado prazo e com determinado juro que ainda estão a ser negociados.

- 6,250€ ?! Mas eu estou no desemprego, não arranjarei tal quantia...

Estás tu, e mais uns tantos - sensivelmente 10% da população está desempregada e endividada [5] - portanto, podes imaginar o que está a acontecer. Não esquecendo que existe a inflação pelo meio disso tudo...


O quadro não está nada bonito.

- Já percebi que estamos em maus lençóis.. Não podemos simplesmente negar esses empréstimos?


Ouviste falar nas empresas de rating? Elas ditam o quanto vale o teu país e a tua economia, nomeadamente a tua indústria, os teus serviços, etc. E nestes últimos tempos (duma forma clara e sucinta) elas descreveram o que era Portugal para os investidores: LIXO.
Esses investidores vão fugir de Portugal, de tal forma que o país não conseguirá gerar dinheiro. (Na verdade pode, mas isso implicaria uma gestão bem feita - coisa que os políticos não querem fazer.)

Pois bem, um país que não produz, com vários problemas sociais a nível da educação, formação, saúde, empregabilidade, criminalidade, etc.,   Isto aliado a uma má gestão que já reina à décadas só resulta numa coisa: tempos difíceis. É aí que entra a 'ajuda' - injecta dinheiro na economia para tentar reanimá-la, atraindo também investidores...mas se esse dinheiro não for bem gerido, bem podem vir mais pacotes de 'ajuda', que não saímos da cepa torta.


Portugal cedeu a essa pressão e aceitou o empréstimo...

- E agora?

Agora? Agora resta-nos continuar a nossa vida na esperança de que as medidas tomadas não sejam catastróficas. E temos que estar cientes de uma coisa MUITO IMPORTANTE:


Portugal deixou de ser um estado soberano. Agora, as regras não são mais ditadas pelos nossos políticos, mas sim por uma comissão externa que não conhece a nossa realidade. Como tal, pode ir qualquer político para o poder, pois na realidade, esse poder já não existe. Os nosso políticos, passarão a ser fantoches e marionetas articulados desde Bruxelas.



- Ok, entendi mais um pouco disto tudo. E quanto ao restante discurso do Sócrates? Pelo que vejo, ele é que nos vais ajudar. Já não posso com a oposição, chumbaram o PEC que nos poderia salvar das medidas de austeridade que aí vêm, certo?

O restante discurso de Sócrates é a cereja no topo do bolo da sua estratégia política.

"Lutei nestes últimos anos para que isto não acontecesse. Tínhamos uma solução e ela foi deitada fora (...) Sempre encarei um pedido de ajuda externa como um último recurso. Tudo tentei, mas em consciência julgo que chegámos ao momento em que não tomar essa decisão acarretaria riscos."
A solução de que fala, o PEC4, são medidas que José Sócrates já esperava serem chumbadas pela oposição liderada por Passos Coelho (PSD), isto, devido ao seu ultimato: ou aprovam o PEC, ou demito-te. A oposição, na esperança de ocupar o lugar do primeiro-ministro, fez-lhe esse favor. Com cessação dos seus poderes agendada para 5 de Junho de 2011 (data das legislativas), o nosso PM fez o seu golpe genial - avançou com o pedido de ajuda externa. Ora, até 5 de Junho, Portugal saberá quais as medidas (de austeridade) enviadas pela UE. E o povo, indignado (sim, porque não deve vir dali coisa boa), vai colocar as culpas em quem? No PSD e restante oposição, porque não aprovaram o PEC4 proposto pelo primeiro-ministro José Sócrates. E as tendências de voto mostram que o povo (alienado) continua a gostar de Sócrates [6] - o demissionário que se recandidata.


O quê? Mas ele não queria sair do governo?!


Queria, mas era a brincar. Isto faz tudo parte de estratégia política e manipulação da opinião pública - NÓS!

Fontes:

Sociedade - Afinal o que é?

Nomear um blog de "Sociedade Alienada" sem dar uma breve explicação aos leitores sobre o que é a sociedade, não faz muito sentido, pois falaremos constantemente nela directa, ou indirectamente e ela será sempre o nosso referencial - pois nós somos essa sociedade.





"Uma pessoa que não consiga viver em sociedade, ou não necessite por ser auto-suficiente, ou é uma besta ou é um Deus." - Aristóteles




Poderia falar sobre os vários tipos de sociedade que existiram ao longo dos tempos até chegarmos à sociedade actual - A Sociedade de Consumo, mas o meu objectivo não é esse, pois pretendo dar minha opinião sobre a sociedade do ponto de vista do observador que relaciona os problemas actuais com as vivências em sociedade.

O Indivíduo e a Sociedade
Vejamos a definição de sociedade no dicionário:

sociedade
nome feminino
  1. conjunto de pessoas que vivem em estado gregário, corpo social;
  2. conjunto de pessoas que mantêm relações sociais, colectividade;
  3. estado dos animais que vivem normalmente em agrupamentos;
  4. relação entre pessoas, convivência.
Não podemos negar que fazemos parte da sociedade. Estamos rodeados por ela (pois nós somos os seus elementos), recebemos os seus valores desde pequenos, quer queiramos, quer não. E só mais tarde, com o desenvolvimento (ou não) da nossa opinião e sentido crítico é que percebemos o quanto estamos enquadrados com essa sociedade à qual pertencemos.
- Explica lá isso melhor?
Imagina o seguinte:
  • nasceste num país em guerra, onde desde cedo te dão uma arma para aprenderes a lidar com ela e para matares "os inimigos" (que nem sabes porque são teus inimigos...mas enfim). À medida que cresces, apercebeste que algo está mal, pois tentas perceber um pouco do que se passa à tua volta e claramente entendes que retirar a vida a um semelhante é um acto condenável. Decides mudar de atitude e a partir desse momento, excluiste-te parcialmente dessa sociedade, pois deixaste de partilhar alguns dos seus valores e costumes.


- Isso não é assim tão fácil...deixar de fazer algo que sempre me foi incutido assim?
Sim, não é fácil executar esse tipo de reforma no pensamento (e consequentes atitudes), mas ela (a reforma) é possível. A sua eficácia só depende das nossas motivações.
- Mas...e a sociedade? Não resiste à minha mudança?
Resiste pois, em maior ou menor escala, acabas por sofrer sempre influências que te levam a pensar que afinal as tuas ideias parecem um devaneio...e que a verdade, é aquilo que é proclamado na generalidade, aquilo que é proclamado pela sociedade. Mas...

...nem tudo o que é normal, é o que está certo.
Muitas das coisas que actualmente fazemos nem questionamos porque as fazemos, não só porque "sempre assim foram", mas também porque a sociedade já desenvolveu mecanismos para as manter. Desde pequenas coisas como as tuas regras de alimentação, às mais complexas como a sociedade de consumismo na qual vivemos.
- Humm...Mecanismos?! Não estou a ver nenhum...
Exemplo: 
O fato e o "status" social 
Quantos de vós já questionaram a razão pela qual existe o fato e gravata? Não é só para andarmos vestidos certamente, pois para isso existem vestes bem mais práticas e diga-se de passagem, bem MAIS baratas. O fato e a gravata existem por uma "imposição social".
Sim, imposição...
Apesar de efectivamente ninguém colocar essa imposição (excepto algumas excepções), em muitos sítios, principalmente nos locais de trabalho, muita gente usa fato - o belo e vistoso fato. E porquê? Sinceramente, acho que não sei. Vejamos: o fato não te dá inteligência nem capacidade de raciocínio, não te dá destreza nem qualquer outro tipo de outro faculdade, mas...o fato deixa-te integrado num local onde toda a gente usa fato.
- Ok, e mais?


É só isso.


- Só?!


Sim, só. Aposto que ninguém está de manhã no teu quarto a dizer o que tens de vestir, mas para te sentires bem e enquadrado num local onde todos estão de fato, automaticamente ganhas esse bloqueio mental que te leva a agir da mesma forma.


Agora aplica isso em grande escala, em outro grandes temas como a economia, por exemplo. Mas isso será tratado com mais calma noutro dia.


Deixo-vos um vídeo sugestivo:


Os Cinco Macacos


E com isto, já me alonguei...

quarta-feira, abril 06, 2011

Elogio à Criatividade


Discutia eu com o Saraiva sobre qual deveria de ser o primeiro artigo deste blog alienado e chegámos à conclusão que para já cada um deveria escrever sobre o que lhe apetecesse.

Admito que ainda não tinha escrito nada aquando do surgimento do primeiro artigo dele. Pensei eu para mim: "Hum...não contava com um artigo tão criativo, pensei que fossemos começar com algo mais objectivo. Hum...um momento...não seria má ideia...Que tal falarmos de criatividade?" Bora!

Segundo a fonte de conhecimento universal - Wikipédia - o conceito criatividade tem diversos significados, sendo este o meu preferido: "Criatividade representa a emergência de algo único e original" em vez de, por exemplo: "Criatividade é o processo que resulta em um produto novo, que é aceite como útil, e/ou satisfatório por um número significativo de pessoas em algum ponto no tempo". O segundo, provavelmente define melhor esse conceito em termos técnicos, mas julgo que o primeiro é mais subjectivo e deixa mais espaço à imaginação.

Na minha perspectiva, a criatividade pode manifestar-se de toda e qualquer forma, em todo o ofício em que nos seja permitido exercer o livre arbítrio. A criatividade acaba por ser o maior instrumento intelectual que todo o ser vivo possui. Está integralmente ligado à evolução do mesmo, quer esta seja má ou boa. Ser criativo significa arriscar, sair da zona de conforto. Significa dar uma contribuição pessoal ao mundo, pintá-lo com cores diferentes ou dar uma nova razão para querermos que o Sol nasça no dia seguinte. Serve para isso mesmo, quebrar o marasmo da nossa existência. Infelizmente a utilidade desta, estará directamente ligada à boa ou má natureza do seu criador.

Por norma associa-se criatividade a correntes artísticas como pintura, música, cinema ou simplesmente à escrita de um texto. Eu digo para ir-se mais além com este conceito. Porque não associar-se a critividade à fórmula matemática que Leibniz inventou ou simplesmente o novo caminho que tu descobriste ontem para te levar ao trabalho ou ainda à nova posição sexual que experimentaste com o(a) parceiro(a). Todos nós temos criatividade, uns mais que outros: é inegável; porém, ainda existem muitos com medo de a por em prática.

O apelo que faço aos leitores, acaba por ir de encontro com o post do caro co-autor do blog, ou seja, um apelo à tentativa de quebrar a rotina com pequenos ou grandes lampejos de criatividade, o que certamente vai dar mais significado à vossa existência neste maravilhoso planeta no qual muitos estão a ser a criativos no que toca à sua destruição... mas isso será outro tema para breve.

Sociedade Alienada





Acordaste, mais um dia te espera.

Ainda ensonado relembras o sonho que ainda agora vivias, mas que já parece tão distante. 
Colocas os pés no chão, a tentar encontrar os chinelos...o contacto com tapete fofo faz-te pensar como é bom acordar assim. 

Cantarolas aquela música enquanto tomas banho; vestes-te, tomas o pequeno-almoço...

Sais para trabalhar, hoje vais de comboio - é um dia diferente, como uma homenagem ao ambiente: ontem viste aquele programa televisivo que alertava para as elevadas emissões de CO2 nas cidades e decidiste ir de comboio.

As pessoas vão caladas, atoladas, cada uma com a sua forma e feitio, mas todas vão ao mesmo...todas vão trabalhar ou estudar. Nesta altura do ano são poucos os que estão de férias e vão até à praia naquele comboio.

O trabalho não é fácil. Está tudo muito difícil por lá...mas tu tens poucas responsabilidades, afinal, o teu trabalho é bastante patético, simples e quase inútil. Mas dá-te o pão que comes todos os dias e o abrigo que te protege da intempérie.

No regresso a casa, vais procurar o carro - já nem te lembravas que tinhas vindo de comboio - "Que porcaria!..."

Em casa és invadido pela publicidade no correio, na TV e ouves aquelas notícias da tal guerra que começou lá naquele país onde eles são todos malucos. "Coitados!" - pensas tu...e mudas de canal. "Olha, está a dar aquele programa." - e que te faz esquecer o teu sonho de hoje.

Que te faz esquecer o mendigo que viste no comboio, o sem-abrigo que dorme na escadaria do teu prédio e aquela guerra chata que eles se fartam de falar na televisão.

Esqueces essas coisas; nem te questionas porque elas acontecem...

Esqueces essas coisas, porque afinal elas até são normais - sempre estiveram ali.

Já nem te lembras porque foste trabalhar de manhã, aliás, nem te lembras porque trabalhas sequer...assim de repente pensas que seja pelo dinheiro, para pagares as tuas coisas. Mas não fazes caso...

...e voltas à tua sala, àquele programa de TV divertido, que te poupa dores de cabeça e não te obriga a pensar muito - afinal, é o fim de um dia de trabalho.

E aquele sonho?

...lembro-me vagamente das flores e do campo, de correr com ela de braço dado...mas nada mais. Já foi à muito tempo, é irrelevante. 

"Never again will you be capable of ordinary human feeling. Everything will be dead inside you. Never again will you be capable of love, or friendship, or joy of living, or laughter, or curiosity, or courage, or integrity. You will be hollow. We shall squeeze you empty and then we shall fill you with ourselves." - George Orwell in Nineteen Eighty-Four